quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Batidas Beatificadas, Ainda Ressonando


A circulação de costumes fora do padrão perpetrada pela chamada Geração Beat se consolida até hoje, através de influência de uns mitos tipo Jim Morrisson ou Bob Dylan. I'm Not There filme recém lançado que conta a vida de Dylan, mostra a passagem de quando o bardo do folk conhece seu ídolo beat e futuro amigo, Allen Ginsberg. É o único momento do filme em que um dos Bob Dylan retratados (são vários retratados, cada hora como uma personagem diferente, uma criança negra, uma mulher, um velho, um preso etc) se mostra uma pessoa humilde.


Posteriormente ao contato com a geração dos 60, Allen Ginsberg se envolveu com diversas bandeiras e projetos musicais. Primeiro, foi a legalização do aborto e da maconha. Depois, envolveu-se com os punks engajados do The Clash, que fizeram parceria com ele na excelente música Ghetto Defendant. Depois, Paul McCartney e Philip Glass musicaram com ele o poema The Ballad of the Skeletons, uma de suas mais contundentes letras que, mesmo sendo de 1986, parece que foi escrita hoje. Já postumamente, o DJ Spooky remixou o poema End the Vietnam War, com o próprio Ginsberg declamando e, mesmo retratando um fato datado, soa simpático. Até o Rage Against the Machine já ‘declamou’ um poema de Ginsberg ao vivo.

Já o eterno adicto Willian Burroughs foi ator em diversos filmes e produziu canções com nomes bem distintos um do outro, de Kurt Cobain a Ministry, de The Doors a Kate Bush etc. Um filme que eu recomendo, onde Burroughs faz um papel de um padre que é quase ele mesmo é Drugstore Cowboy, sobre pessoas que assaltavam farmácias para se drogar. Uma canção bem relax que ele fez com o R.E.M. e que ficou muito bacanuda se chama Fuck Me Kitten, onde imagina um relacionamento passado com Marlene Dietrich.

Jack Kerouac, o beat mais famoso, morreu direitão. E bem mais cedo que seus pares, por isso o que se encontra dele no mundo da música e do cinema é tributo/citação. A banda brasileira Gang 90 fez uma música com o nome dele, com o finado vocalista Júlio Barroso sonhando ser o próprio mito beat. Além da citação Só As Mães São Felizes, título de uma música e de uma biografia sobre Cazuza também ser de autoria de Jack Kerouac. Em 1997, foi feito um tributo a ele chamado Kerouac: Kicks Joy Darkness, com Morphine, Patti Smith, Tom Waits, Hunther Thompson etc.

No fim do ano passado, a mídia espalhou a notícia de que Walter Salles iria filmar o clássico On The Road com Johnny Depp no papel principal. Resta saber se sai da gaveta mesmo e se vai prestar.

O responsável por trazer a literatura beat ao Brasil, já na década de 1980, foi o poeta maldito curitibano Paulo Leminski. Daí houve um hiato nos 1990. E nos últimos anos a editora L&PM passou a lançar muita coisa deles em pocket, inclusive uma célebre tradução/introdução à On The Road do célebre jornalista Eduardo Bueno.

Hoje em dia, se formos medir a influência da geração beat no mundo da música, encontramos ecos também nas obras de Beastie Boys, Bad Religion, The Raveonettes, Queens of the Stone Age e num monte de roqueiro degenerado por aí.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Batidas Beatificadas

Há alguns anos o professor de fotografia Rui Cezar sugeriu aos seus maus alunos que não quisessem tomar recuperação final para fazer um trabalho paralelo que até hoje não esqueço. Com o passar do tempo, acabei mergulhando naquele tema, sobre um movimento ligeiramente desconhecido ou visto com maus olhos pela maioria das pessoas. E se uma grande porção de mitos beberam na fonte deles, os Beatniks, algo de bom deve ter saído dali.

A palavra batida possui várias conotações na língua portuguesa. Pode designar ritmo musical, colisão automobilística, coisa ultrapassada, coquetel alcoólico, comida, montaria, uma diligência policial em local suspeito ou um rastro (no mato). No caso da sua correspondente em inglês, beat, que também é cheia de sentidos e pode ser entendida musicalmente falando, além de ser muito empregada para designar algo como um 'cara batido', 'escória' etc.


No ano de 1948, o escritor Jack Kerouac enxergou na palavra beat o termo latim correspondente a beatitude e cerca de dez anos depois a estrutura dos costumes ocidentais já não era a mesma, meio que influenciada por isso. Após a consolidação do best-seller Pé na Estrada (mais conhecido como On The Road), escrito durante uma semana sob intensas doses de efedrina por Kerouac, ocorreu uma busca individualista em não se encaixar mais sob o sonho do american way of life.

Paulatinamente o grupo de escritores amigos de Kerouac, já denominados Geração Beat, alimentou a incitação pra que cada indivíduo deixe de lado seus desejos consumistas, expondo as veias endinheiradas da América. Claro que em pleno período de caça às bruxas, foram acusados de comunistas, porém, como a maioria deles era apolítico ao extremo, logo espantaram as acusações cegas dos políticos conservadores adeptos do movimento Macartista pras cucuias.

Diversos autores, como o poeta Allen Ginsberg ou o relator drogadicto Willian Burroughs eram colocados como personagens (sempre com nomes fictícios) nos livros de Kerouac. Logo foram se tornando respeitados pela sua facilidade em levantar a discussão sobre diversos temas polêmicos ou vanguardistas. Desde ecologia, budismo, literatura oriental, banditismo, legalização das drogas, aborto, liberdade sexual e outros tabus dos quais hippies e punks levantariam bandeira nas décadas seguintes. Se formos considerá-los como a primeira subcultura de massa do planeta também não estamos falando mentira.

No fim da década de 1950, o movimento foi de beat pra beatnik e concretizou-se como um sucesso na grande mídia. O sufixo 'nik' vem da paranóia americana com os costumes que os beats amalucados escancaravam, tão forte como o recém-lançado (naquela época) satélite russo Sputnik, o primeiro a circundar a esfera do planeta.

No fim das contas, até havia uma relação do movimento com o fotógrafo suíço radicado nos Estados Unidos, Robert Frank, mas aí já é outra história. Assim como dizer quem foram os músicos, artistas e cineastas que piraram na fórmula beatífica dos beats.