quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Pra quê tanto apetite?

"Daqui da fome dá pra ver o que acontece", será? Assim a fome sem fim de nossa espécie é analisada num trecho da canção-título de Fome de Tudo, o novo disco do Nação Zumbi. Disco virtual, diga-se de passagem, já que eles entraram na onda de vender pela net. Fazem uns dias que achei o disco por aí, de cara encontrei uma falha comparando com os dois anteriores; onde está aquela música que você gosta de ouvir sem parar? Será que isso é realmente um problema?

Não que o disco seja ruim, seria difícil pra quem já fez tanta coisa boa errar tão feio. Legal que Jorge du Peixe está mais generoso e deixa os seus companheiros participarem mais nas vozes. Ou seria a mão do produtor pseudo-brasileiro Mário Caldato Júnior (Beatie Boys, Molotov, Björk, Beck etc), que chegou leve, mas com certeza trouxe uma sonoridade suingada para a banda de Recife? Caldato trouxe com ele o tecladista dos Beatie Boys, Money Mark para participar da faixa Assustado. Há também participações de Júnio Barreto em Toda Surdez Será Castigada que trouxe uma leveza necessária à canção, além da queridinha Céu na sombria Inferno, onde a moça parece ter ficado um pouco tímida.

Um disco se faz pela sua coesão. De repente seja cedo para dizer que este trabalho seja o mais fraco comparado aos dois últimos, pois o foi o que me pareceu. Destaque tímido para Onde Tenho que Ir, raspando nos bons momentos.

Engraçado que essa preguiça com o disco novo do Nação Zumbi ter vindo após eu ter ficado sabendo no Futuro da Música que eles não dão entrevista que não seja para aquele canal que só tocava videoclips e hoje só tem nome de música. Imagina, num festival, você indo entrevistar uma das bandas principais e só aquele canal de televisão antipático tem sua exclusividade? Eu entendo um contrato desses, afinal eles têm que comer né? Seria daí a Fome de Tudo?


terça-feira, 16 de outubro de 2007

Ele Bebeu Cigarros Bagaraio

Pra finalizar a saga gainsbourgiana, não poderia deixar alguns aspectos da vida do senhor da canção francesa passar batido. Como assim canção francesa? Serge Gainsbourg pode ser considerado um vanguardista popular mundialmente falando, pois já na década de 1960, fazia um liquidificador sonoro repleto de temas sexistas e escatológicos em sua influente obra. Por exemplo? Tinha uma música chamada "O Furador da Passagem de Metrô" e um disco com o nome de "O Homem com a Cabeça de Repolho" que, relevante notar, na foto ao lado há um repolho e passagens de metrô jogadas em seu túmulo como lembranças ao finado. Já que suas letras nem sempre faziam muito sentido, demorou a fazer sucesso em seu próprio país. Quando estourou o disco de reggae no fim da década de 1970 é que seus discos anteriores foram resgatados como clássicos, e, aí sim, começou a vender de verdade.

Pois quando ele apareceu, o iê-iê-iê estava dominando as paradas do mundo todo e, como bom francês, se negou a seguir tendências do que acontecia pelos países anglo-saxônicos. Nunca alcançou sucesso nem na Inglaterra nem nos Estados Unidos enquanto vivo, mesmo tendo se casado com a atriz Jane Birkin (dela indico o clássico Blow-Up, de Michelangelo Antonioni, em que aparece deliciosa no papel de uma groupie fanática pelo fotógrafo-protagonista).

Ah, existem dois discos de tributo a ele, um de 1997, chamado Great Jewish Music - Serge Gainsbourg, só tem duas músicas boas, com excesso de nomes alternativos e esquisitos, mas ao menos todas são cantadas em francês. E Monsieur Gainsbourg Revisited, de 2006, repleto de bandas americanas e inglesas indiezinhas fazendo covers em versões traduzidas para o idioma dominante. Um desastre, salvo raríssimas exceções.

Existem alguns álbuns dele que não se pode esquecer, como Aux Armes et Cætera (1978), inteiramente gravado na Jamaica com apoio dos papas rastafari, Sly Dunbar na bateria, Sticky Thompson na percussão, Robbie Shakeaspear no baixo e das I Threes fazendo backing vocals. Certa vez ouvi uma história interessante, que não tinha na biografia, não sei se é verdade, mas vou contar assim mesmo. A integrante das I Threes, Rita Marley, cantou suas partes no disco direitinho, mas quando seu marido, o pacífico Bob Marley, ficou sabendo do conteúdo das letras, quis matar o cantor francês, que felizmente já tinha retornado pra casa. Porém, a verdadeira polêmica deste disco se sucedeu na França, quando os versos iniciais da faixa título do álbum foram ressoados neste reggae;
Allons enfants de la patrie / Lê Jour de gloire est arrivé”; pra nós, mortais que não falamos francês não é nada, mas isto é a introdução da Marselhesa, o hino dos galeses. Foi uma afronta do tamanho de God Save the Queen, dos Sex Pistols ou do Star Spangled Banner sarcasticamente levado por Jimi Hendrix em Woodstock.

Histoire de Mellody Nelson (1971) é um álbum temático sobre o amor de um homem mais velho por uma ninfeta, considerado pela maioria dos fãs como a obra máxima de Serge. Já eu, pessoalmente prefiro Bonnie & Clyde (1968), que ele escreveu para Brigitte Bardot na época do filme hollywoodiano homônimo, grande sucesso naquela época.

Ironicamente, um dos mais famosos discos do cantor filho de imigrantes judeus russos nascido na França é uma afixação pelo nazismo. Ninguém poderia brincar tanto com o tema quanto Serge, pois viveu sua infância afligido pela matança de seus semelhantes, fingindo ser católico. É outro disco temático, quase um psychobilly, repleto de perversão e sanguinolência, nos moldes de Rocky Horror Show, denominado Rock Around the Bunker (1975).

Sempre compôs músicas para as grandes divas da canção francesa enquanto viveu, desde Brigitte Bardot, Françoise Hardy, Juliette Greco, a Catherine Deneuve, passando por Vanessa Paradis (a Vou de Táxi original, lembra?).

Aqui, uns fatos interessantes para ilustrar o balaio de gatos que era a vida dele. Pra começar, escreveu uma auto-biografia quase dadaísta, em forma de paródia, onde a personagem principal, que dá nome ao livro, Evguénie Sokolov, é um super-herói que adquire o sucesso através de flatulências. Claro que o livro foi massacrado pela crítica, mas deve ter rendido boas piadas, com certeza. Organizava, junto do pintor surrealista Salvador Dali, amostras de filmes bizarros só para amigos e policias, que eram seus companheiros de porre pela madrugada de Paris quando ninguém atendia seus telefonemas. Até Leão de Prata no festival de cinema em Cannes ele recebeu por dirigir um comercial para produtos de cozinha. Só não falei que ele era formado em Belas Artes e fissurado nas vanguardas artísticas do século XX. A sorte é que seu pai, que era pianista na noite, arrastou o filho para tocar em bordéis nada amistosos no subúrbios de Paris, o resto todo mundo já sabe.

Então, deixo uma palha do original Gainsbourg com a então amada Bardot, em versão art pop trash;

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Bebi Cigarros Demais

Os grandes cânones musicais costumam ser algumas das coisas mais chatas para se escutar no cotidiano. Quer seja por repetição contida em nossos genes, dos amigos, ou de gente que não suportamos, sempre há um motivo para que venha uma canseira natural em escutar certas coisas que todo mundo escuta.

Certas pessoas, como eu, têm uma tendência a cansar daquilo que nos é colocado de forma impositiva. Claro que de certa forma, quase tudo acaba sendo. A não ser que seja uma busca pessoal de cada um por suas novidades através de dicas de bom gosto ou influências a partir de algo que a gente gosta.

Pois foi a partir do prezado cantor de calypso Mike Paton que conheci uma grande música chamada Ford Mustang, que sabia desde o princípio ser de Serge Gainsbourg, ‘aquele cantor barangão francês’, o mesmo que compôs aquela música de motel que todo mundo conhece, Je T'Aime (Moi Non Plus). Pronto, bem aos poucos comecei a pegar músicas e ler sobre o tal camarada. E não é que comecei a gostar?

O que começou a me pegar no som deste beberrão e fumante inveterado é que cada música dele que eu pegava era de um estilo musical diferente. Ou seja, tudo que os Beastie Boys ou o Beck queriam ser se estivessem na década de 1960. Até então, eu tinha pegado umas canções picadas. Aí comecei a catar os álbuns, que vieram cair tão bem aos meus ouvidos como nordestino em São Paulo.

Difícil dizer por qual estilo musical o senhor Gainsbourg trafegou com maior desenvoltura, se pelo jazz, o rock, o reggae, o rap ou até mesmo pela bossanova. Sei que fiquei impressionado com o tanto de medalhão da música que diz ser apreciador da obra dele, desde o povo do Sonic Youth, My Blood Valentine e Pulp à Michael Stipe, Placebo, Franz Ferdinand, Feist, Rakes etc. No Brasil, eu não sei de gente que se diz explicitamente influenciada por ele, mas sei que Jane Birkin, ex-esposa e eterna musa do figura, fez dueto com Caetano Veloso em uma releitura de Leãozinho. E que em 1984, na trilha sonora da mini-série global A Máfia No Brasil, sua música Sex Shop foi incluída e fez relativo sucesso.

Mas peraí, se você procurar algo sobre Serge Gainsbourg no Google, vai ver que hoje em dia ele é apenas o pai da atriz e cantora moderninha Charlotte Gainsbourg, afinal ele faleceu em 1991, depois de uma vida desregrada, cheia de mulheres e polêmicas. Uma delas eu indico pra assistir aqui, que gera um desconforto digno da mais estapafúrdia cena de Woody Allen, quando o senhor Gainsbarre (apelido que ele se dava quando bêbado) abordou a cantora Whitney Houston ao vivo em rede nacional francesa com um sonoro “I want to fuck you”, vale a pena ver;


Bem, finalmente, como terminei de ler o livro Um Punhado de Gitanes - Biografia de Serge Gainsbourg, de Sylvie Simmons, ainda vou colocar mais alguma coisa sobre a vida dele aqui na sequência.